quarta-feira, 23 de setembro de 2009

América Latina e a “Má-Vontade” da Mídia: O Brasil e o Golpe de Estado em Honduras


A crise hondurenha chegou a um novo impasse. Com o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya refugiando-se na embaixada brasileira foi criado um sério e delicado impasse diplomático. A crise hondurenha se alastra há quase três meses desde a junta de generais do exército de Honduras, comandado por Roberto Micheletti, destituiu Zelaya do poder pela clássica via do golpe de Estado.


Desde então Zelaya vem peregrinando pelos principais países da América Latina em busca de apoio político para restituir seu poder. Com seu senso de oportunidade, o presidente Hugo Chávez foi o primeiro a estender a mão abertamente para Zelaya e oferecer “toda a ajuda possível” para a dissolução do impasse. O Brasil condenou a ação golpista dos generais hondurenhos e, assim ocorreu sucessivamente como todos os países do continente americano, além da União Européia. O presidente estadunidense, o democrata Barack Obama, mais preocupado (e atolado militarmente) com suas guerras particulares entre Iraque e Afeganistão, apenas deu um aceno discreto contra o golpe.


Desde esta segunda-feira, 21/09, o presidente Zelaya se refugiou na embaixada brasileira em Tegucigalpa, capital de Honduras. O exército de Micheletti sitiou a embaixada brasileira que se encontra cercada de soldados o que contraria todas as normas internacionais de violação de espaço diplomático. As informações que chegaram de Tegucigalpa relatam que o fornecimento de luz, água e telefone foram cortados da casa onde se localiza a embaixada brasileira. O governo de Micheletti ordena que o governo brasileiro entregue Zelaya para a “justiça hondurenha”, porém diz que “não invadirá” a embaixada. Em declaração do presidente Lula em Nova Iorque (onde se encontrar para o discurso anula da Assembléia Geral da ONU), afirma que o país não entregará Zelaya por considerá-lo como um “refugiado político” no interior da embaixada. A crise hondurenha entra no seu clímax na medida em que as horas passam e a possibilidade de invasão à embaixada é um perigo real. Caso haja a invasão da embaixada brasileira pelo exército hondurenho, o Brasil poderá oficialmente entrar em guerra com o governo de Honduras. Até o momento que é redigido o presente texto, eis o palco na mais recente e delicada crise diplomática que o Brasil está enfrentando nos últimos tempos.


Não se pode menosprezar a crise hondurenha como um fato isolado. A instável América Latina não pode dar o luxo de um retrocesso ditatorial como marcou sua história política, em especial ao longo do século XX. Caso deseja ser um “global player” no palco instável das relações internacionais, cabe ao Brasil apoiar decisivamente o presidente Zelaya e participar ativamente como mediador para uma solução pacífica que possa restabelecer a norma democrática em Honduras. O povo hondurenho carece de resolver este impasse e não ser subjugado via violência explícita pelas forças golpistas.


Entretanto é importante destacar a má-vontade que a imprensa brasileira vem tratando o Golpe de Estado em Honduras. Aliás, é sempre a mesma história na grande mídia brasileira que revela o preconceito endógeno e “americanizado” contra os países da América Latina. Venezuela, Equador, Bolívia, Cuba, Paraguai e Argentina geralmente são tratados como personagens teatralizados e sendo tratados pela grande mídia como republiquetas fanfarronas sem fazer a devida e necessária análise dos fatos. O maior exemplo é a caricatural desenho que a grande mídia brasileira faz do presidente Venezuela, Hugo Chávez, com se este chefe de Estado eleito democraticamente pelo seu povo não merecesse um mínimo de respeito. O mesmo da análise preconceituosa do presidente boliviano, Evo Morales, tratando-o nas entrelinhas com sendo um mero “índio comunista”. Bem diferente é o “afetuoso” tratamento que a grande mídia oferece ao presidente colombiano Álvaro Uribe, cujo histórico político está ligado ao narcotráfico e, por sua vez, mantém “laços carnais” com o governo de Washington. Se maiores constrangimentos, a mídia brasileira destila suas tintas douradas e seus louros de apoio entusiasmado ao “Plano Colômbia” e o suposto combate ao narcotráfico. Para os mais desavisados, quem não conhece a história é “abduzido” pela grande mídia, mesmo porque é mais fácil ser “simpático” aos heroísmos estadunidenses do que algum nicho boliviano ou venezuelano: eis a pobreza cultural colonizadora! Bombardeado pela grande mídia, o poder de “livre interpretação” ou o usufruto da castigada expressão bíblica do “livre arbítrio” por parte do “consumidor de notícias” é mera retórica.


Grande parte deste “desinteresse” latinoamericano de grande parte da mídia pode se explicado pelo excessivo desejo psicanalítico e tupiniquim de ser espelho estadunidense. Por exemplo, criar falsas-verdades e questionamentos banais sobre atuação da diplomacia brasileira com relação à Zelaya é desinformar aos leitores, ouvintes e telespectadores brasileiros. É particularmente notável a quantidade de bobagens que são transmitidas em canais de televisão e rádio que beira a má-vontade ou total falta de informações coerentes. Quando o preconceito é a aculturação fala mais alto, o resultado não poderia ser outro senão a desinformação e a cultura de ranço colonizadora. Aliás, são essas as bases que sustentaram o intelecto da elite que sitiou o poder na sociedade brasileira.

O campo das Relações Internacionais não pode ser visto como lúdica disputa de partida de futebol onde vários times nacionais jogam entre si para a conquista de um troféu. As questões são sempre delicadas, instáveis e multilaterais. Eventualmente, com o manejo incoerente ou incompetente dos vários níveis de interesses existentes, uma decisão tomada poderá desestabilizar toda uma região. O diálogo é a única maneira de encontrar soluções mais confortadoras e pacíficas que visem o bem-estar comum de toda uma região. No caso específico da América Latina, é fundamental a união dos países deste bloco para que seja possível ser construindo uma nova era de evolução e cooperação política, socioeconômica e cultural. O sangue jamais poderá ser moeda de troca nas conversações internacionais e toda guerra deverá ser descartada para o bem da razoabilidade humana.


Ao contrário que a má-fé de setores da grande mídia brasileira prega em seu sacerdócio noticioso, o fortalecimento de uma América Latina compacta permitirá que muitos países que encontrem hoje em situação de crise socioeconômica possam dar um salto qualitativo em suas nações. Países de grande pujança econômica como Brasil, México, Argentina e Venezuela somente terão a ganhar com uma fortalecida unidade latinoamericana. A UNASUL (União de Nações Sul-Americanas) é uma grande realidade e deverá ser fortalecida, enaltecida e ampliada.


O retrocesso político das ditaduras movidas a golpes de Estado devem ser veemente combatidas por todos os membros da OEA (Organização dos Estados Americanos). A questão hondurenha é emblemática. Somente a recondução de Manuel Zelaya à presidência daquele país trará um pouco mais de calmaria política e também intimidadora de desejos golpistas ao redor da América Latina. Por sinal, o continente americano precisa de uma cultura de paz, equidade e cooperação mútua com uma radical amplitude de democracia política, econômica e social.




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Para quem deseja conhecer mais sobre política externa latinoamericana apresentarei um trabalho:

II Simpósio de Pós-Graduação em Relações Internacionais do Programa “San Tiago Dantas” (UNESP – UNICAMP – PUC/SP)

16 de novembro de 2009 – Memorial da América Latina - 16h30min

“Pragmatismo, neopopulismo ou governança popular: novos ares na política externa latino-americana?” Wellington Fontes Menezes

Veja a programação completa com bons e interessantes trabalhos aqui ou acesse:
http://www.santiagodantassp.locaweb.com.br/br/simp/programacao.html

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