É
uma ilusão acreditar na possibilidade de um capitalismo "livre",
convivendo com o ideal de uma democracia robusta e plena. O cenário que vem se
mostrando ao mundo é o de uma violenta reacomodação dos interesses dos
capitalistas após a crise de 2008. Sintoma desta situação é o ressurgimento com
grande força de uma onda de partidos políticos e líderes populistas de direita
pregando capitalismo ultraliberal e, particularmente, o fim de direitos
trabalhistas.
O
fundamentalismo religioso e o irracionalismo culturalista são estimulados, tal
como a onda das "identidades" que inventam uma miríade de
sexualidades, alimentam um histrionismo egocêntrico do indivíduo contra valores
coletivos e fantasiam míticos discursos étnicos de surreal ancestralidade, aos
moldes dos contos da Carochinha.
Diante
desta onda de retrocesso da razão e com a imposição autoritária, deve-se lembrar
do refluxo dos partidos de esquerda na ação política e dos governos
progressistas no continente americano. Casos mais notáveis são dos Estados Unidos, Brasil e Bolívia.
A
subida do bilionário estadunidense, Donald Trump, ao poder, deu uma guinada
radical na agenda reacionária de Washington. Foram poucos os presidentes dos
Estados Unidos que falaram tão escancaradamente contra direitos dos cidadãos do
próprio país e abusaram de atitudes autoritárias, tal como Trump. O cenário
internacional refletiu a agenda ultraconservadora de Trump e, por sua vez,
contribuiu para muitos políticos populistas de direita conquistarem cadeiras
nos parlamentos e, diretamente, nos centros de poder executivo de seus
respectivos países.
Na
onda de Trump, temos o trágico caso brasileiro. Após o golpe de Estado de 2016,
que derrubou a presidenta Dilma Rousseff, a sequência catastrófica da
fragmentada democracia brasileira, em 2019, seguiu com a ascensão de uma junta
miliciana de um inédito jaguncismo fascista de massiva popularidade, galgando
ao poder. Na corrida eleitoral de 2018, ocorreu, por via de um fraudulento
processo jurídico, a retirada do principal candidato das esquerdas e líder das
pesquisas de intenção de voto, Lula da Silva, à presidência do Brasil. Sem um
nome de consenso para a disputa eleitoral, um velho e medíocre político
ultraconservador da extrema direita, Jair Bolsonaro, com a candidatura fascista
foi eleito.
Em
2018, o então presidente Evo Morales, na Bolívia, ligado originalmente aos
povos indígenas daquele país, foi derrubado com a subida de fascistas
paramilitares religiosos, por via de um violento golpe de Estado.
Em
todos os casos, contaram com a destacada anuência da justiça dos respectivos
países. Um dos braços mais ativo da onda autoritária, o Poder Judiciário,
participa com poder quase ilimitado, dentro das forças tripartites da
República, tomando conta dos demais poderes, sempre com a justificativa da
moralidade e a falaciosa sacrossanta missão do "combate a corrupção".
Utilizando-se
apelos moralistas irracionais e angariando apoio das burguesia locais, os fascismos, em diferentes estirpes, ganharam
discursos, estratagemas, corpo, militantes e simpatizantes e, por fim, adentram
nas democracias locais para impor uma ordem de subserviência aos donos do
capital e à supressão de direitos trabalhistas e civis, eclipsando o horizonte
da liberdade e da real justiça social.
A crise da democracia, ao redor do mundo, reflete a mudança da tolerância dos
capitalistas aos regimes políticos. A construção democrática é um tear sempre
muito complexo, que pode, ou não,
atender aos anseios mais imediatos dos capitalistas.
Apesar da complexidade dos fatos políticos, é pertinente ressaltar que as duas trágicas guerras mundiais do século XX tiveram, essencialmente, motivações econômicas movidas pelos interesses dos grandes capitalistas. O capitalismo nunca foi um fiel fiador da democracia liberal e a História sempre mostrou toda a mordaz intolerância do capital.
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