terça-feira, 3 de novembro de 2020

ELEIÇÕES NOS ESTADOS UNIDOS: A LATINIZAÇÃO DA DEMOCRACIA E O FEITIÇO DO FEITICEIRO

Esta semana será decisiva para os Estados Unidos: a eleição que escolherá aquele que possuirá, como poder máximo, a primazia genocida de apertar o botão que detonaria toda a vida na Terra.

A maior potência bélica do planeta escolherá seu novo gerente majoritário. De um lado, o canastrão bilionário Donald Trump tentará sua reeleição, cuja administração está marcada na história, como a causadora do maior desastre sanitário, devido à negligência governamental com relação aos riscos oriundos da pandemia do novo coronavírus. Do outro lado, quase octogenário Joseph "Joe" Biden, ex-vice-presidente de Barack Obama, que tentará ser o novo presidente de uma potência em franca decadência.

Tanto o republicano Trump, quanto o democrata Biden, tem em comum serem velhos ricaços que falam para o seu público, o velho dito da "América para os americanos". Nos debates televisivos, a senadora afro-americana Kamala Harris, vice de Biden pareceu ser mais proeminente do que Mike Pence, vice de Trump. Tal qual no Brasil e no protagonismo dos vice-presidentes na história, em casos de presidentes anciãos, o vice se projetará ao poder. Um fato que não pode ser descartado nesta tumultuada disputa eleitoral.

Os interesses estadunidenses no globo se ampliaram com o seu crescimento econômico consistente e colossal. Lembrar que, até o final do século XIX era provinciana política estadunidense, a qual passou a operar em uma lógica que a tornou maniqueísta, durante o ingresso do país na Primeira Guerra Mundial: o mundo, então, se divide em dois, os americanos e seus interesses globais e os outros. É importante ressaltar a guinada colonialista dos Estados Unidos no século XX e sua supremacia como potência militar após a Segunda Guerra Mundial.

A guerra fria travada com a antiga União Soviética aperfeiçoou substancialmente o seu parque industrial bélico e ampliou a demanda por domínios coloniais, seja do ponto de vista econômico, seja do ponto de vista ideológico. Isto inclui também interesses geoespaciais com investimentos pesados no ramo astronáutico.

Para os entusiastas do modelo democrático estadunidense colocando-o como um totem da história, ao estilo de Francis Fukuyama, é importante estar atento. A arquitetura do regime estadunidense é para consumo próprio, ou seja, para os interesses das burguesias locais. Para quem está situado ao lado dos "outros", logo, o resto do planeta não-estadunidense e que não faz parte dos interesses de Washington, não adianta ter delírios sobre a "democracia americana": ela é bem clara, ela serve somente aos estadunidenses!

Em meio às eleições, a pandemia do novo coronavírus se aproxima dos 240 mil mortos e 10 milhões de contaminados, em números acumulados com COVID-19 em solo estadunidense. Em um clima eleitoral dos mais disputados e confusos da história recente dos Estados Unidos, Trump já se antecipou e fez declarações sobre sua indisposição em deixar o poder, caso seja derrotado em sua escalada na busca de novo mandato. Fato inédito na história institucional da orgulhosa "grande democracia da América". Alguns de seus apoiadores com perfis psicopatas estão armados, os chamados "supremacistas nacionalistas", ou seja, milicianos fascistas integrantes de grupos de extrema direita estadunidense, estão dispostos a entrar em combate em nome de Trump. Nunca a democracia estadunidense esteve tão ameaçada ao ponto de se assemelhar a um esboço cinematográfico de guerra civil em tempos recentes!

Na onda identitária do cínico "politicamente correto" estadunidense, tem-se as contendas raciais entre brancos, afro-americanos, mestiços, amarelos... Os nascidos na América, ou convertidos pelo "green card", podem se matar no plano interno, porém se o assunto é o patrocínio de golpes de estado e destruição de países alheios, suas lideranças estão juntas! Se "vidas negras importam", leia-se, "vidas americanas importam", o que vem, além disso, é mera demagogia produzida por Hollywood, para criar a imagética de uma "potência cordial e cidadã do mundo".

Para o Brasil, embriagado com a insensatez genocida de Bolsonaro, o cenário pouco se alterará com a eleição de qualquer um dos dois postulantes. O país entrou em uma política suicida de subserviência nunca observada na sua história. Os interesses de Washington se tornaram os próprios interesses automáticos da turma de Bolsonaro, com o seu vira-latismo ensandecido e irresponsável. Na gestão de Bolsonaro, a matriz das relações exteriores brasileira, o Itamaraty, se tornou uma espécie de embaixada dos interesses da Casa Branca. É inacreditável o nível de promiscuidade presente nas bolorentas políticas de relações exteriores brasileira na gestão catastrófica de Bolsonaro.

Nos próximos dias que se estenderão por meses, haverá um processo de ampliação da tensão política nos Estados Unidos. Ao contrário das principais democracias mundiais, o processo eleitoral estadunidense é uma roleta russa, cujo resultado nem as principais pesquisas eleitorais conseguem captar com certeza mediana. O processo eleitoral é lento, caótico, ultrapassado e poderá até distorcer a vontade popular, resultando em confusões gritantes, tal como ocorreu na primeira eleição de George, o controverso filho do ex-presidente Bush, que, mesmo perdendo na votação da população, diante de um cenário conturbado nas eleições de 2000, ganhou no Colégio Eleitoral.

Outro exemplo catastrófico da distorção proporcionada pelo sistema eleitoral dos Estados Unidos deu margem ao triunfo de Trump. As pesquisas eleitorais mostraram um cenário o qual daria vantagem à então democrata Hilary Clinton, em disputa com Trump, em 2016. Após os votos apurados, se confirmou a vantagem popular para Hillary que ficou com 48,18% dos votos válidos contra 46,09% de Trump. Contudo, no Colégio Eleitoral, a situação se inverteu, Trump foi consagrado vencedor com 304 votos, contra 227 de Hillary. Isto se dá pela representação dos estados na federação que compõe o intrincado sistema político dos Estados Unidos onde alguns estados tem mais representatividade política do que outros. A composição do Colégio Eleitoral representa este mosaico distorcido entre o voto da população e a sua representatividade.

Brigas internas, escândalos sobre fraudes eleitorais, contendas políticas buscando ser resolvidas no braço pelas ruas, judicialização das disputas eleitorais, negação dos resultados da eleição pela parte vencida e clima de golpe de estado, são exemplos que contribuem para um "caldo de cultura" destrutivo que os Estados Unidos fomentam e ofertam ao mundo, ao longo de sangrentos anos, em especial, aos países latino-americanos.

Agora, como se vê, "o feitiço está se voltando contra o feiticeiro", tudo no formato de uma dantesca tragédia ao estilo hollywoodiano e sem direito ao Oscar.

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