domingo, 30 de agosto de 2020

O CAVALO DE TRÓIA E O ARDILOSO SERPENTÁRIO DO CAPITAL

        

         Não há dúvida que o identitarismo é um cavalo de Tróia dentro das esquerdas. Munidos pelo ressentimento de origem e alucinados pelo deslumbramento do capital, os ativistas identitários utilizam-se da moralidade e da cultura do senso comum, para moldar uma realidade que se forja a partir de uma distorção do real e que é regurgitada com elementos irracionais de entendimento de mundo.

Em plena pandemia causada pelo contágio do novo coronavírus, o Sar-Cov-2, quando o capital está em mais uma crise sistêmica, uma oportunista e sintomática onda "antirracista" emergiu usando a pele estigmatizada de um segmento dos trabalhadores, para  impulsionar o salvamento da pele escamosa dos capitalistas. Curiosamente, as críticas diante da ação genocida do capital que ignorou a pandemia e expôs milhões de trabalhadores à uma doença ainda sem cura, foram tão insuficientes que passaram quase que  desapercebidas. Todavia, o contágio de causas identitárias tomou conta do debate público, criando polêmica e desviando o foco das responsabilidades dos capitalistas frente à pandemia.

Nada é tão curioso quanto o apoio midiático a causas "boazinhas", moralmente úteis, para fazer espuma e distorcer a realidade dos fatos. Se a suposta "causa cidadã" não oferece riscos ao capital, a burguesia tende a abraçar, patrocinar e moldar a seu bel-prazer.  Afinal, exceto os fascistas por convicção, quem seria contra a proteção de nichos de suposta "representação minoritária", como a "mulher" ou o "negro" numa sociedade? Esses elementos abstratos e genéricos de um discurso rasteiro, impregnado de um vitimismo social, ganham uma superdimensão ideológica na guerra cultural imposta pelo capital e pela hegemonia do pensamento autoritário neoliberal.

Ninguém nega o quanto a questão racial é intrínseca a qualquer sociedade, com seus efeitos nocivos, a cada uma delas. Todavia, em plena ascensão da extrema direita nas democracias mundiais, promover um ataque às esquerdas se tornou mais interessante a partir de dentro das próprias esquerdas, impulsionando o típico motor da direita: a exploração do elemento moral. Um grande "golpe de mestre": fragilizar de vez as esquerdas utilizando-se da abdução de seus próprios membros!

            Num passe de mágica pandêmica, vem a "onda identitária racial" para atacar o novo vilão do “planeta capital”, a "esquerda branca". Pasmem! Nas trevas dos estratagemas burgueses, inventou-se o mote da tal "esquerda branca", para se posar como o novo bicho-papão que, sorrateiramente, assume um protagonismo bizarro diante do rol da "vilania mundial" e protege todos os financiadores capitalistas de movimentos e ativistas identitários. Nesta prepotente lógica, o problema então seria que a “esquerda branca” não se interessaria pelos problemas étnicos e carecia então de um novo grupo hegemônico da “política de esquerda” proveniente do Olímpio africano de pele negra. O surrealismo da premissa megalomaníaca só não é maior do que o fanatismo dos ativistas que exalam suas verborragias maniqueístas infanto-juvenis sem pudores.

Na loucura descarrilhada identitária da promoção de nichos exóticos dentro da estrutura social, a ideologia em prol do capital se manifesta explicitamente: os capitalistas deixam de ser os inimigos dos trabalhadores, mas    assumem a idealização do genérico mito do "homem branco", cuja sexualidade é o desejo de atração por mulheres! Simplicidade tão patética quanto a mediocridade de acreditar que o capitalismo se importa realmente com o tom de pele de seu servo assalariado e submisso às condições de trabalho imposta pelo patronato. Como é possível que as esquerdas impulsionem tamanho disparate e se imbecilizem com um discurso infantil do jardim do sanatório?

O fenômeno da promoção das "identidades" não é novo, mas tomou contornos mais agressivos nos anos 2010 no cenário mundial e, claro, com reflexos no Brasil. A promoção de um patológico narcisismo sociocultural foi um dos estratagemas do capital para ampliar a competividade fratricida entre os trabalhadores e quebrar as suas resistências na organização solidária contra a exploração capitalista.

As esquerdas foram usadas como "barriga de aluguel" de grupos com estratagemas protofascistas e, agora, elas se veem sendo devoradas pela metástase do identitarismo, cujo mote é a desconstrução da ideia de luta de classes e a implantação da demagogia do empoderamento do sujeito egóico, abduzido pelas maravilhas do "livre mercado". As esquerdas se encontram cada vez mais desunidas e fragmentadas pelas fantasias de um ativismo cego, narcísico e oportunista, resultando na promoção do próprio desvairado ego. Um sintoma tresloucado do delírio infanto-juvenil do atual momento das esquerdas é a glamourização de tagarelas oportunistas de Youtube que vêm se posicionado como referências "intelectuais" de uma esquerda cada vez mais desorientada, abobalhada e irracional.

A classe deu lugar à mitologia eugenista da pureza racial às avessas. Não mais o branco seria cor da "civilização", mas todos aqueles com peles "não-brancas" pertencentes à uma ancestralidade divinal da "Mãe África", o idílico "verdadeiro berçário" da natureza racial. Os mitos dão combustível à ideologia neoliberal do empreendedorismo do gueto racial, ou seja, o sujeito que "se faz por si mesmo" dentro de uma sociedade protagonista de um suposto "racismo estrutural". O romantismo típico do enredo hollywoodiano é sedutor e captura a subjetividade de sociedades destroçadas pelos efeitos nefastos da carnificina neoliberal.

No Brasil, é visível que o irrealismo e o anacronismo são elementos que estão sendo usados fortemente para o controle social por uma burguesia perversa e genocida. Além de promover a extrema direita bolsonarista, os tentáculos dos capitalistas promovem outros grupos supostamente à "esquerda" do espectro político, os identitários. Assim, os donos do grande capital, em ambas as pontas, podem controlar tanto o campo de uma direita mais liberal e reformista, quanto da "esquerda reformista". Os discursos e os estratagemas de ambos os grupos, extrema direita e identitários, são da mesma matriz: o apelo ao moralismo como fonte primária que deve ser explorada à exaustão!

Acuadas e sem um programa alternativo do qual possam se valer contra a hegemonia da extrema direita e seus interlocutores, as esquerdas, agora, são atacadas internamente, pela horda furiosa da alienação identitária que apenas enxerga elementos morais, como os constituintes dos problemas sociais. O capital consegue parir milagres!

No Brasil abduzido desde as infames "jornadas de junho" de 2013, os ovos do serpentário da direita golpista de 2016 eclodiram e deram origem às facções bolsonaristas. Da mesma forma, os ovos do serpentário das esquerdas começam a se abrir, com suas crias no identitarismo protofascista, bem dentro dos "ninhos esquerdistas".

Uma lição não deve ser esquecida: se as crises do capital são sistêmicas, a força da gênese mutante dos estratagemas da burguesia capitalista é de uma criatividade de sobrevivência tão hercúlea que desafia qualquer natureza supostamente predestinada dos fatos.

 

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Wellington Fontes Menezes (Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense/UFF)

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

ATACAR SEM PAUTAR É ATINGIR O QUE NÃO SE VÊ!

         

            Antes de tudo, gostaria de dizer do meu apreço por Christan Dunker, professor do Instituto de Psicologia da USP, cuja produção científica ultrapassou os muros da Cidade Universitária. Dunker, o qual respeito pela qualidade do seu trabalho, surpreendeu-me ao ler no "Blog da Boitempo", o seu artigo tão equivocado, desnecessário e ressentido para atacar, sabe-se lá quem, de forma indiscriminada, que ele rotulou de "esquerda".

No artigo em questão, entre os fatos citados, os quais são uma colcha de retalhos típicos de atitudes de centros acadêmicos universitários, com suas birras de sempre, sobressaltou-me Dunker invocar um oportunista de Youtube, Jonas Manoel, como uma espécie de "interlocutor de Marx". Daí foi chutar o pau da barraca da alucinação! Menos, bem menos, Prof. Dunker!

A partir da velha questão do que seria a "esquerda", esta vulgata genérica que mais parece um cestão de frutas de diversos formatos e gostos, se faz necessária a pergunta para Dunker: "Qual esquerda"? Será que Dunker outorga a todos os oportunistas da internet, destiladores de irracionalismos esdrúxulos para encherem os bolsos e tagarelarem senso comum ao estilo papo de boteco, embutidos em egos patológicos, com o irrestrito selo de "esquerda"? Afinal, para quem foi direcionada a crítica de Dunker?

Alguém que entende razoavelmente das estruturas do capital, deve saber que não se trata do "ódio ao dinheiro", mas como ele circula e se concentra, de forma tão desigual e perversa, numa sociedade capitalista, pautada em consumismo psicótico e pobreza extrema.

Dunker já escreveu artigos muito melhores e  instigantes. Este foi um dos mais atípicos e infelizes. Enfim, melhor sorte no próximo, Prof. Dunker!

 

sábado, 8 de agosto de 2020

PANDEMÔNIO: A PERMANÊNCIA DE UMA CRISE

 

Quanto mais se estuda a história natural da COVID-19, mais são observadas as dificuldades de se conter o seu avanço e de se avaliar as suas implicações biológicas nos seres humanos. Conforme estudos relatados, tudo indica que o novo coronavírus veio, de fato, para ficar, ou seja, será endêmico nas áreas globais correspondentes aos grandes grupos populacionais, com respingos nas áreas de menor concentração de pessoas. Assim como as variantes do vírus da "gripe comum", o voraz coronavírus Sars-Cov-2, causador da COVID-19, ficará circundando o nosso cotidiano, sem desaparecer!

A esperança da humanidade de se livrar do novo coronavírus se restringirá à uma vindoura vacina eficaz que imunizará, por tempo prolongado, o contingente populacional humano do globo. No momento, várias vacinas estão em fases de testes em estágios variados de desenvolvimento. Apesar do esforço para abreviar o tempo de preparo de uma vacina, ainda é incerto dizer se realmente terá sido elaborada uma com a desejada eficácia imunizadora e, importante ressaltar, de forma mais duradoura.

As aberturas comerciais prematuras e irresponsáveis vêm se mostrando catastróficas nas grandes economias. O exemplo mais notório são as principais cidades europeias que receiam uma “segunda onda” de contaminação pelo novo coronavírus, assim como ocorre em regiões da China e de alguns países asiáticos. Vice-campeão mundial em número de mortos derivados da contaminação pelo novo coronavírus, o Brasil é o vergonhoso exemplo genocida mundial de uma abertura completamente irresponsável das áreas comerciais e convive com uma média diária acima de mil mortes em decorrência da COVID-19.

Não há segredo quanto à forma padrão de contaminação pelo Sar-Cov-2: a circulação de pessoas leva proporcionalmente à enorme circulação do vírus. O desejo de lucro imediato do capital insaciável ignora a pilha de mortos já contabilizada e está levando a novos casos de contaminação pelo vírus e, consequentemente, elevando o número de vítimas fatais e criando um ciclo vicioso, difícil de ser interrompido sem medidas de isolamento e distanciamento sociais mais drásticas.

Não há solução mágica diante da maior crise sanitária global de todos os tempos. Apesar dos protestos de impaciência de patrões ávidos por lucros, ignorantes performáticos e negacionistas sociopatas de plantão, ainda as medidas de isolamento social (confinamento residencial), combinadas com o distanciamento social (distância segura entre duas ou mais pessoas) são os melhores meios de prevenção da doença devido à rapidez incessante do contagioso vírus.

O falso dilema que se instalou durante a pandemia foi de um sadismo feroz: doença ou emprego? Patrões buscaram, a todo o momento, sabotar o isolamento social para colocar uma faca no pescoço dos trabalhadores para que eles retornem aos seus empregos sob a ameaça explícita de demissões em massa. A desculpa básica foi que a paralisação das atividades econômicas, ou seja, o emprego de “lockdown” (fechamento por completo) e as medidas parciais de restrição de circulação afetaria toda a sociedade. Empresas gigantescas diziam ao mundo que uma parada temporária de alguns dias colocaria em risco a sobrevivência delas. Parece inverossímil que empresas bilionárias não conseguissem resistir à algumas semanas de paralisação de suas atividades e, desta forma, colocavam tal poderio econômico como se fossem meros botecos ou padarias de esquina!

Todavia, justamente são os pequenos comerciantes e os trabalhadores que vivem do setor de serviços os mais afetados economicamente com a pandemia. Para eles os governos deveriam dar subsídios para que possam atravessar o período de inatividade produzida pelas restrições de circulação devido à pandemia. As ações de apoio econômico emergencial para os trabalhadores e a população socialmente vulnerável são fundamentais para o êxito da prevenção da doença e para dar adesão social às medidas restritivas de circulação. Ademais, a higienização com álcool e derivados do cloro ajuda na limpeza e desinfecção, além do uso massivo e obrigatório de máscaras e protetores faciais.

Diante da pressão dos patrões, diversos governos tiveram a dura missão de tentar fazer um ajuste entre medidas sanitárias restritivas e abertura econômica. No geral, o que aconteceu foi uma política de controle seletivo que pouco foi ajustada à realidade, perante o combate ao novo coronavírus. No caso brasileiro, o governo de Jair Bolsonaro nunca levou a sério a pandemia e o resultado tem sido catastrófico. A resposta à crise de Bolsonaro foi debochar diariamente da pandemia e ignorar a pilha de mortos que se avolumou tão velozmente, chegando aos dias atuais ao genocídio de 100 mil vidas desperdiçadas! Os poucos êxitos perante a crise da pandemia foram operacionalizados por governadores de olho nas próximas eleições e prefeituras locais. O “lockdown”, na prática, quase não existiu na esmagadora maioria das cidades brasileiras mais afetadas pelo contágio. Sem uma política conjunta e clara a respeito do combate ao vírus, o cenário foi alarmante: praticamente todas as cidades brasileiras tiveram algum nível de contágio, chegando ao patamar de três milhões de contaminados na primeira semana de agosto, em números oficiais.

Dentro de todo o cenário descrito, mais uma crise do capital se instala no meio da pandemia. Possivelmente tão mais letal que a última, no final da década de 2000. Quem pagará a nova conta da catástrofe intrínseca nas estruturas do capital? Certamente não deverá ficar no lombo dos trabalhadores. Entre outras medidas, é urgente a taxação dos intocáveis bilionários que ficam cada vez mais ricos, diante da miséria alheia. Não será uma única medida que saneará todo o contingente de necessidades estruturais que minimizarão as inacreditáveis disparidades sociais globalizadas, mas é inaceitável que milhões morram para dar sustentação a um minúsculo punhado de parasitas do capital, nutrindo-se da desgraça social. A marca da macroestrutura do capitalismo é sua metamorfose e, em meio a uma pandemia, seu estratagema é se alicerçar em sua fase genocida, onde corpos não significam nada diante dos lucros que não podem parar com sua sangria ávida, através da ação avassaladora do capital.

A devassidão do capital é maior do que qualquer pandemia. A unidade se faz pelo conjunto e não pelos filetes da fragmentação social. Mais do que atiçar questões sobre a subjetividade de flutuantes identidades e operacionalidades de um narcisismo do gueto, com ressonâncias de inúteis polêmicas midiáticas, a agenda que precisa ser retomada, pelos setores progressistas, contra o avanço da devastação capitalista na pandemia, é o retorno da luta de classes e o sentido de batalha incessante pela sobrevivência frente à voracidade do capital.

Passamos por um momento histórico que demonstrará a nossa capacidade de resistência racionalizada e responsável diante da pandemia, ou o escancaramento da pulsão de morte que levará milhões de vítimas diretos ao cemitério. Neste cenário perturbador, as urgentes respostas governamentais levarão a salvar vidas, ou ceifá-las, diante de uma tragédia amplamente anunciada. Não haverá alternativa e será imprescindível lutar por ela: a escolha pela preservação da vida deverá ser eternamente a meta prioritária da humanidade.

(Wellington Fontes Menezes)

sábado, 1 de agosto de 2020

A DESGRAÇA DA EXTREMA DIREITA NUNCA MORRE!


Não há descanso para a extrema direita em todo o mundo.

O negacionismo é um dos elementos básicos do fascismo e em épocas de crises econômicas, políticas ou sanitárias, a ignorância sistematizada aflora e transborda de forma manifesta para os militantes do extremismo político de direita.

Na Alemanha, o berço do nazismo a partir do inicio dos anos 1920, a extrema direita nunca deixou de existir em diversos grupos distintos em nomenclatura, mesmo após o término do genocida Terceiro Reich de Adolf Hitler. Nem a Segunda Guerra Mundial, momento histórico que uniu capitalistas ocidentais e a socialista União Soviética, foi capaz de colocar um fim da barbárie fascista.

No Brasil, a maldição da extrema direita não deixou a sociedade em paz. Mesmo após os genocidas e parasitários generais militares golpistas do macabro período da ditadura civil-militar entre 1964 a 1985, a extrema-direita ressurgiu em 2013, efetivamente, com a campanha civil-jurídico-midiática antipetista. Após o golpe de Estado de 2016, o esfacelamento politico apoiado pelos setores burgueses e seu aparelhamento jurídico, pariu o momento histórico de colocar no poder, em 2018, o líder do genocida jaguncismo fascista brasileiro, Jair Bolsonaro.

A pandemia do novo coronavírus e as medidas de isolamento social foram um prato suculento para a truculência da extrema direita e seus militantes embriagados de perversão, em todo o mundo, exporem seus ideais genocidas de destruição da humanidade.



TRUMP NÃO FOI UM (NOVO) ACIDENTE DA HISTÓRIA. FOI UMA ESCOLHA!

  Quase todas as tentativas de explicação que surgem do campo de uma Esquerda, magnetizada pelo identitarismo, é de uma infantilidade atroz,...