domingo, 1 de janeiro de 2023

⭕ NOVO ANO, ENTULHO VELHO: PARA NÃO SE ILUDIR EM 2023


Não basta trocar o calendário, quando o assunto é política brasileira. Neste primeiro de janeiro de 2023, Lula assume o seu terceiro mandato presidencial, diante da mais grave crise institucional desde a redemocratização do país, em 1985. Abalado por um golpe civil-jurídico-parlamentar em 2016, o Brasil jamais voltou a ser o mesmo. Entretanto, isto não significa que antes era "muita coisa".

Jair Bolsonaro foi o asteroide errante produzido e impulsionado pelas frações em disputa dentro da burguesia nacional para impor "caos e desordem" em nome da reorganização da exploração do trabalho e acumulação de riquezas. Diante da esteira da fabricação da histeria projetada nas massas, o populismo de extrema direita se tornou popular, um fenômeno jamais visto no Brasil. A loucura das massas se tornou o imperativo político considerável, diante de um país perdido em si mesmo, há quase uma década. Nada mais emblemático, entre tantas outras cenas dantescas do sanatório produzido por Bolsonaro no país, do que militantes bolsonaristas fazerem “vigília” nas portas de quartéis em algumas cidades brasileiras a espera do “milagre golpista” após a derrota eleitoral do “mito”!

Foi uma eleição presidencial violenta, dramática e com decisão muito apartada em 2022. De forma emblemática e histórica, Lula venceu por um fio de cabelo de sua barba às eleições e, por sua vez, tem várias missões hercúleas diante de um Brasil dividido entre a insanidade dos apoiadores bolsonaristas e a euforia histérica de um neopetismo. Conforme observado na pajelança do “governo de transição”, insistindo em velhas práticas, entre elas, Lula desejará reconstruir a ilusão da "união entre classes", ou seja, o velho conchavo da "conciliação" entre burguesia e miseráveis. Diante da retomada da força da ampla burguesia, a classe trabalhadora se tornou débil e enfraquecida, tanto política, quanto ideologicamente. 

Possivelmente, projetando o cenário nacional de hoje seja similar ao do início dos anos 2000, quando Lula assumiu a primeira vez a presidências do Brasil, a aposta da conciliação seja seu farol de horizonte político. O desenho do novo ministério de Lula é de uma pobreza de originalidade tão incrível que somente se justifica pela obsessão de praticar a bolorenta “política de conciliação de classes”. Este é um fator que poderá causar muitos problemas para a própria governabilidade do governo Lula diante de um Congresso Nacional que continua sendo um latifúndio do Baixo Clero partidário da Direita e das piores práticas do clientelismo político.

A máquina burguesa de destruição de direitos trabalhistas foi ligada a todo vapor após o golpe de 2016. As alardeadas “reformas trabalhistas” que prometiam gerar “novos postos de trabalho”, foram exitosos engodos. Na prática, tais reformas arrebentaram, ainda mais, as leis que protegiam os trabalhadores (o cínico termo “flexibilização” se tornou eufemismo para destruição!). Ademais, aprofundou a desarticulação sindical e, como esperado, os moribundos sindicatos foram relegados para inúteis entrepostos burocráticos. A palavra "greve" foi, praticamente, banida do vocabulário dos trabalhadores formalizados e o mar de precarização se tornou a regra na retomada do processo de acumulação de capital do patronato.

Nas últimas décadas, o Brasil sofre uma profunda mudança de sua matriz econômica em dois aspectos: retrocesso industrial e ampliação da produção de bens primários. Tal fato reflete, no plano externo, as variações globais da economia e, no plano interno, a luta entre as frações da burguesia por hegemonia e poder. Isto explica, em grande parte, o imenso apoio recebido por Bolsonaro por parte dos setores robustos do agronegócio, setores extrativistas e pequenos burgueses proprietários de negócios.

No campo das lutas sociais, a realidade exposta em desemprego, miséria e fome foi capturada pela ideologia culturalista do "identitarismo neoliberal". Municiado por um viscoso discurso capitalista do "empoderamento empreendedor" com apologia rasteira da miséria hedonista, tudo se resume à extrema regressão cognitiva moralista pautada no catecismo do subjetivismo de uma Santa Trindade obsessiva. Jamais descemos tão fundo no abismo da miséria cultural, educacional e intelectual diante de um período histórico que carece de inteligência, percepção de mundo, união e práxis. A atual vanguarda do “pensamento crítico” pós-moderna vem sendo caracterizado em um mar de oportunistas em busca da ostentação narcísica sendo utilizados como fantoches da nefasta apologia do capital. 

As ilusões sobre apostar todas as fichas em Educação caíram por terra durante a pandemia. A sociedade do capital não sobrevive sem o seu maior ativo: a dinâmica do moto-contínuo motor econômico da visceral sobrevida. A Educação civiliza, mas não produz milagre! O país apostou no modelo educacional e cultural nas mãos da ideologia do capital e, hoje, colhe alienação social sob a forma de analfabetismo funcional e a produção inesgotável de um lastimável aterro sanitário cultural. Logo, se forjou a "tempestade perfeita": submissão ao capital, domesticação da percepção conformada da miséria e o retrocesso socioeconômico como conforto da "alma brasileira".

Pouco adianta reforçar as apostas na ilusão do cotismo na Educação como fugaz "facilitador" de ascensão social das camadas mais baixas da população ou, ainda, a demagógica "paridade de gênero" em cargos de alto escalão da burocracia estatal. Vale lembrar que uma performance narcisíca é igual a trovão: faz muito barulho, mas não produz quase nada real! Na prática é mais do mesmo, ou seja, mudar para não mudar nada! Os frágeis e midiáticos truques neoliberais, que tanto encantam as esquerdas pós-modernas, tem fôlego curto e, na prática, somente, apenas "turbinam" os discursos de violência e ódio da extrema direita em meio ao desamparo social.

O que deveria ser objeto de preocupação por parte da cúpula petista é a total falta de horizonte do frágil projeto que Lula e o PT venderam nas eleições. Por outro lado, como o objetivo maior era a derrota do catecismo de devastação de Bolsonaro, tudo foi validado, inclusive a ausência de um mísero projeto de nação. Velhos artifícios neoliberais como programa de transferência de renda, endividamento por dívida (o "festejado" microcrédito) e "empoderamento" do desempregado, ou seja, o “empreendedorismo para pobres”, não resolve e, tampouco, leva a nenhum desenvolvimento amplo, sério e consistente. Ademais, segue no ar o golpismo arraigado no parasitismo das Forças Armadas que tanto apoiaram todos os golpes de Estado do Brasil, assim como o nefasto governo Bolsonaro e a tentativa frustrada de golpe pelo “mito” durante o período eleitoral e após a vitória de Lula.

A realidade carece, urgentemente, de dinâmica econômica com enfrentamento dos privilégios usurpadores do capital. Combater a concentração de renda dos setores mais parasitários do capitalismo brasileiro deveria ser uma das principais metas de um governo que se autodenomina de "esquerda". Todavia, com Lula e o PT, aparentemente, não estará em pauta esta questão. Sem um programa mínimo de governo, dificilmente o governo Lula sucesso em curto prazo. Lula deveria estimular um sistema de cooperação produtiva entre os trabalhadores, ampliar meios reais de acesso a cidadania, executar projetos de infraestrutura de integração regional (dando ênfase ao setor da circulação e escoamento de bens, como ferrovias e zonas portuárias), ampliação nacional de moradia popular, criação de frentes de promoção ao trabalho e renda, estimulo à massificação da vacinação contra a COVID-19, por exemplo, deveriam compor um projeto mínimo de ação governamental em busca da saída do fosso que se encontra o país.

Sem uma noção clara de que os problemas do país vão muito além do léxico gramatical ou querelas da subjetividade, Lula e o PT terão a árdua tarefa de conduzir o país para outro rumo que não seja a mesmice da retroalimentação de uma economia voltada para concentrar renda em função do deleite de um punhado de capitalistas. Sem tal horizonte em vista, toda a “esperança” poderá cair por terra e apenas requentar as velhas práticas do clientelismo político, ampliação do desemprego estrutural e a perpetuação de uma economia para muito poucos. O resto será subdesenvolvimento e miséria sistêmica. Não há mágica, sem saber os rumos os quais deseja desenvolver o país. É preciso ter mais juízo do que sorte!


Wellington Fontes Menezes – Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF)

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