sábado, 12 de junho de 2010

Almas Secas: A Perpetuação do Genocídio (Parte 2 de 3)



Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado

Pedindo pra chuva cair sem parar

(“Suplica cearense”, Gordurinha/Nelinho/Luiz Gonzaga)



Sabidamente, a desnutrição, a subalimentação e a fome são elementos de voraz impacto no corpo, seja no âmbito físico, seja nos interstícios psicológicos. A miséria é o monstruoso produto principal da concentração excludente de riquezas. Moradores de zonas de habitação precária, por exemplo, em momentos de destruição causada por desastres ambientais são tratados como indigentes ou párias sociais. Em áreas de violência endêmica como nas favelas que margeiam os grandes centros econômicos, em nome do combate ao narcotráfico, sucedem-se cenas de assassinato de pobres pelo poder de coerção policial com a benção velada do Estado e aplausos disfarçados de segmentos da sociedade mais abastados (uma forma fascista de minimizar a pobreza matando os pobres!). O cataclismo da fome ainda é muito mais latente em zonas esquecidas pelo Poder Público e somente lembrado em período eleitoral, acentuadamente no Norte e Nordeste do Brasil. Aplicar indiscriminadamente políticas de renda mínima (as populares bolsa assistencialistas) sem construir um aporte de recursos que possa criar um circuito auto-sustentável de riquezas materiais e humanas é perpetuar a endemia famélica.

A fome urge e se faz necessária sua eliminação como matriz fundamental de ações do Estado. Privatizar as ações sociais deixando em mãos de ONGs ou empresas similares (geralmente movidas por duvidosos interesses “humanitários”) é covardemente fugir do princípio básico do Estado que é garantir a vida dos seus cidadãos. Pensar o desenvolvimento local é necessariamente criar um conjunto de agregados que privilegie a auto-sustentação dos ambientes de endemia famélica. Políticas de promoção ao emprego e a ampliação de cooperativas de trabalhadores sob a forma de auto-gestão poderão ser usadas como um contraponto a fabrica de espoliação e acumulação capitalista. Calando a veracidade dos intelectuais capitalistas, algumas experiências de cooperativas auto-gestoras mostram a viabilidade real deste sistema.

A política de promoção do ser humano deverá enfaticamente ser sempre a meta de qualquer governo em detrimento da mediocridade atávica gerada pelos favores de campanhas políticas para o grande capital. É muito simples beijar a mão do grande empresário (às vezes, literalmente!), sorrir escancaradamente em luxuosos coquetéis para angariar “fundos de campanha” e preparar planos de governo onde a prioridade é sempre a manutenção da ordem do capital. Apesar da exaustão dos discursos, a fome nunca foi de fato um problema político a ser enfrentado, mas simplesmente é sempre deixada propositadamente de lado. Neste ínterim, Josué de Castro redige: "Mais grave ainda que a fome aguda e total, devido às suas repercussões sociais e econômicas, é o fenômeno da fome crônica ou parcial, que corrói silenciosamente inúmeras populações do mundo".

A brutal desigualdade dos recursos materiais somente não é pior do que a estupidez dos que acreditam que ela é fruto tão natural quanto à fusão permanente de átomos dentro do interior do Sol. Uma sociedade que priva pela competição selvagem somente parirá seu subproduto maior: a cegueira da barbárie. Podemos nos amparar por várias justificativas, porém é inegável o apego à desagregação e o poder de destruição que as sociedades operam no inconsciente social. Muito mais fácil destinar bilhões de dólares à supostas usinas atômicas em nome de “energia limpa” ao invés de investir em estruturas que busquem operar para a dinâmica de trabalho e desenvolvimento local (o caso da construção de usinas nucleares nas terras fluminenses de Angra dos Reis é emblemático).

Para os arautos do desenvolvimentismo às cegas, dirão que a energia é fundamental para a economia, que por sua vez, propicia a criação de riquezas. A pergunta é: quem se beneficia do emprego massivo de recursos públicos destinados a operar dentro das engrenagens da iniciativa privada (seja via direta de investimentos, ou indireta da renúncia fiscal/tributária) em nome santo rótulo do “progresso material”? Se a abundância material é a marca que se projeta do progresso capitalista, qual o motivo da persistência da miséria e da fome? Notadamente, o progresso material na ordem capitalista é profundamente excludente.

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