sábado, 31 de outubro de 2015

O boteco político e o sujeito que goza na sua ignorância primária como mecanismo de defesa


O debate político nas redes sociais, e fora dela, é curioso. Particularmente, curiosíssimo! Um turvo esboço do tempo histórico o qual atravessamos.
Dentre das possibilidades em jogo, vejamos suas ações e consequências do tão alardeado "cidadão de bem", um novo (mas não tão novo assim) eufemismo para relatar o sujeito do cotidiano e que se apresenta como detentor da verdade divina e protegido pela sacralidade cristã.
Se o sujeito está doente, irá um médico. Se o sujeito está passando por problemas emocionais, irá a algum dos meus colegas psicólogos ou psicanalistas. Está-se com fome, certamente irá a um restaurante ou procura entender como se prepara uma refeição.
Porém, quando o assunto é política, o sujeito movido ao bom senso (o qual hoje se transformou no "senso infantilizado"), não tem dúvidas, trata tudo como se fosse matéria da geração espontânea da mente dele numa mesa de boteco, ingerindo todas as doses de cachaça possível para desenrolar um cabedal de bobagens sem limites.
Doravante, existem questões mais profundas. Entre elas a necessidade de refletir os motivos e quais os interesses de fazer da política não um instrumento essencial do sujeito da vida cotidiana, mas um mero objeto banal de pouquíssima importância real na sua vida, exceto para gozo da ignorância primária.
Não devemos canonizar a política (ou qualquer outra área do conhecimento humano), mas é pertinente responsabilizar nossos posicionamentos a respeito dela e, de todo assunto o qual se deseja manifestar como "sujeito-do-suposto-saber". Não é lícito atacar, ofender e depois sair correndo com a desculpa que precisa ir ao banheiro ou que não disse "aquilo" que se pretendida dizer. Atos falhos é a porta dos fundos de uma linguagem operada na inconsciência.
Voltando ao "cidadão de bem". Claro, que ele não quer ouvir ninguém que tenha um mínimo de conhecimento a respeito. Afinal, a tal "política", para esse sujeito, a macro-política, não é conhecimento derivado de um olhar histórico, social, conjectural e perceptivo. Segundo tal premissa, tal sujeito, com seu ego encharcado de ódio primal e ignorância recebida por osmose, tem a ciência que para ele a política é como piolho, ou seja, tem na cabeça de qualquer um que possa ler algumas páginas de revistas sensacionalistas ou noticiários tão elucidativos quanto à claridade das águas do rio Tietê.
Portanto, ao dizer afirmações aleatórias movidas apenas pelo ranço pessoal com se fosse o mais fino substrato da verdade, o desejo de gozar com o ato de odiar um objeto de suposto amor, o sujeito abre mão da possibilidade do debate, ressignificação de concepções e o enriquecimento de idéias, e abraça a sua ignorância primária. Fato que se tornou patente de orgulho famigerado e confiança alucinada do dito "cidadão de bem" diante dos mecanismos de defesa dele.
Diante da terra minada por areia e debates da profundidade de um pires, dentro ou fora das redes sociais, a política se tornou não mais um território da orquestração de suas idéias, posicionamentos e conjecturas, mas um território livre para as derivações composta de um nanômetro de conhecimento, o elogio profundo à estupidez e a consagração das alucinações do boteco no gozo da sua ignorância primária. O caminho é longo e os debates parecem se tornar cada vez mais curtos e povoados de afetações.

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