segunda-feira, 17 de agosto de 2015

De mulher para mulher: as delícias do gozo feminino de exercer o machismo fascista de cada dia



As mulheres são muito mais interessantes para qualquer análise dada sua complexidade e natureza. Chico Buarque, magistral compositor e cantor brasileiro, sabia disso e escreveu um clássico imortal "Geni e o Zepelim", uma ode ao desejo e o escárnio da personagem da canção. Hoje, temos a presidenta Dilma Rousseff como a Geni do momento, merecedora do ódio público, principalmente de uma parcela significativa de mulheres. Neste último domingo, 16 de agosto, mais uma movimentação nacional para a exacerbação do ódio em praça pública municiado pela Grande Mídia. A série de cartazes, gestos e palavras de ódio são representativas de um momento que a pulsão de morte passa a orientar uma parcela da sociedade, sem uma objetividade política mais clarividente, exceto o apelo ao ódio represado do cotidiano.

Dilma é um caso que salta aos olhos e merece reflexão em tempos de gritos fascistas e insanidade coletiva nas ruas. Não apenas por ser a presidenta, mas pela dimensão humana que envolve toda a dimensão do linchamento moral de uma mulher. Pela primeira vez no Brasil uma mulher foi eleita e reeleita como presidenta da república, fato histórico dentre de um contexto de uma política patriarcal e machista. Mesmo assim, nada como criar celeuma diante do fato. Pergunta-se de forma objetiva: se a presidenta não fosse mulher, despertaria tanta inveja e ira de outras mulheres?


Vindo de muitos homens que apenas toleram mulheres para serviços "menores" e sexuais, não poderia se esperar nada além de diferente do patriarcado chauvinista. Um jorro perverso de gozo de pura pulsão de morte diante daqueles que insultam os mais fracos perante os seus olhos. Todavia, nada mais sintomático foi ver e ouvir um bando de mulheres xingado em praça pública outra mulher nestas manifestações midiáticas "anti-Dilma e anti-PT", a presidenta Dilma, com os mesmos insultos que os homens mais boçais e machistas costuma dirigir-se ao "sexo frágil" (por sinal, a fragilidade apenas está na conotação machista do péssimo termo). Mais curioso ainda é que toda esta insatisfação é de conteúdo vazio, sem um significado real, apenas comentários genéricos sobre a pessoa da presidenta. Nenhuma crítica mais consistente sobre a condução do seu governo, exceto pelo apelo histérico de uma suposta moralidade com os pudores do do era vitoriana. Neste caso, o gozo preferido é falar mal, como nos comezinhos da velha fofoca da vizinhança, das festinhas dos sorrisos do cinismo amarelo, dos ambientes familiares e de trabalho.

Daí um dos fatores que é tão difícil de acabar com a violência contra as mulheres quando estas assumem posturas violentas contra si mesmas. A "questão do gênero", tão em moda dos debates de agora e explorada de forma ora simplória, ora e histérica, parece apenas ver a superfície que atinge esta dimensão social subjetiva da violência introjetada e projetada que vai além da natureza meramente aparente.

Aos gritos de "vaca", "vagabunda", "puta", "vergonha", muitas mulheres que participaram do circo dos horrores deste domingo fascista dão o salvo-conduto para todos aqueles que gozam oprimindo o outro ter toda a liberdade de fazer o mesmo com elas. Como se fosse liberado para insultar, bater, arrebentar qualquer mulher "odiada". Se Dilma é a "vaca" desejada do momento eleito por uma parcela de mulheres com verborragia fascista, logo a presidenta seria o objeto da inveja de todas elas. Nada mais amado/odiado do que seu objeto de amor/ódio.


O nosso fascismo cotidiano é muito mais complexo do que a vã filosofia da superfície dos rótulos e do fetiche das nomenclaturas caricaturais. Estamos imerso no velho terreno pantanoso da exploração da política do ódio, onde se estabelece a guerra de todos contra todos e, consequentemente, de forma ambivalente, todos serão violadores e vitimas de si mesmos. 

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