Não há lógica discursiva dentro de uma sociedade sem a atuação
massiva de um lastro operativo ideológico. O sedutor discurso neoliberal do
"empoderamento" tem a mesma raiz da falácia do
"empreendedorismo" que prega a suposta "vontade inato" do
indivíduo que "se faz por si mesmo".
O capitalismo deixou de lado seus aspectos mais práticos e rudes
como forma de atuação social e se se metamorfoseou na atuação sistêmica da
manipulação subjetiva. O mundo do capitalismo "hard" cedeu lugar para
o desejo irresistível e irrefreável de sua faceta "soft" que prega a
"inclusão democrática" de todos no livre mercado dos afetos
orientado, estimulado e manipulado por oligopólios e capital volátil.
Na saraivada de ataques contra as organizações coletivas de
trabalhadores faz parte de uma atualização ideológica do capital frente seus
interesses de atuação sociopolítica. O cerne desta estratégica está na
manipulação subjetiva dos sujeitos e operar no campo do imaginário, visando a
destruição de laços sociais coletivos ou comunitários para
"empreender" a retórica que "cada um poderá ser o patrão de si
mesmo" (mesmo que não tenha nenhuma capacidade para tal ação). Os pontuais
e questionáveis exemplos de "sucesso individual" são repetidos a
exaustão por todo um enorme aparato midiático.
Para desnutrir a organização coletiva da classe trabalhadora, o
discurso do empreendorismo opera na esfera social de desarticulação de uma
possível socialização da produção e consumo. Neste mesmo caminho, o discurso do
"empoderamento" procura operar dentro da lógica narcísica do sujeito
que se imagina poder levantar-se solitariamente contra o "mundo das
dificuldades" para impor a sua vontade subjetiva do ego e, exalando uma
mística "força de vontade", atingir seus objetivos.
A querela falaciosa do "lugar de fala" que se reproduz
na esteira do "empoderamento" pressupõe a interdição do debate social
e a captura da reflexão coletiva para a privatização da "autoridade da
verdade". Uma vez que o discurso casuístico do "lugar de fala"
invoca misticamente o "empoderamento" de um suposto direito exclusivo
de um dado sujeito munido com características narcísicas inatas e exóticas.
Curiosamente, o maniqueísmo é o alicerce de sua operação e tal premissa para
existir de forma midiática, sedutora e inquestionável como ventila seus
profetas, possui a invocação messiânica de um "inimigo" abstrato e
subjetivo a ser ferrenhamente combatido pela "vitima falante" do
"lugar de fala".
Na batalha contra uma racionalidade coletiva, a razão não mais é
invocada (por sinal, ela é vilipendiada!), e emerge das catacumbas de um falso
desejo oceânico exclusivo do sujeito, o misticismo narcisista do exercício
autoritário de uma suposta verdade inquestionável exercida na "prática de
fé" do sujeito.
Nada mais eficiente e selvagem para o capital a manipulação da
subjetividade dos indivíduos que se fragmentam de forma conflitante,
interditado a organização coletiva e orgânica da classe trabalhadora de forma
mais ampla e menos estereotipada. Seria então a solução mágica das organizações
dos trabalhadores abrir mão da busca coletiva contra as forças sempre bem
estruturadas dos capitalistas em prol de saídas individualistas de
protagonistas de si mesmos? Afinal, quem seria contra a emancipação do
indivíduo com suas próprias mãos? Todavia o toque de Midas do
"empoderamento" é mais uma bricolagem ideológica que ao contrário do
mito grego, o ouro se transforma em barro.
Não é a toa a alta adesão do discurso sedutor, esvaziado e estereotipado
do "empoderamento" diante do declínio e desertificação das
organizações dos sindicatos de trabalhadores diante da ofensiva sem trégua do
neoliberalismo e suas novas formas de escravidão dos sujeitos. Se os
capitalistas sempre agem coletivamente tendo o Estado como seu escudeiro, qual
razão prática da atomização dos trabalhadores?